quinta-feira, 1 de outubro de 2020

O esquema de corrupção que pôs fim ao primeiro empreendimento pesqueiro do Brasil

O dinheiro desviado seria usado na compra de barcos de pesca, por exemplo, as rascas, embarcações típicas da Ericeira
O dinheiro desviado seria usado na compra de barcos de pesca, por exemplo, as rascas, embarcações típicas da Ericeira

No dia 25 de março de 1818, Dom João VI assinou o decreto que criava a Colônia Nova Ericeira, o primeiro empreendimento pesqueiro do Brasil. Instalada na Enseada das Garoupas, litoral de Santa Catarina, a colônia recebeu no ano seguinte os pescadores, que vieram da Ericeira, uma vila portuguesa próxima a capital Lisboa. Chegaram também outras centenas de portugueses e brasileiros de outras partes do país.

         Na teoria, a colônia tinha tudo para ser um empreendimento de sucesso. O litoral brasileiro se encontrava inexplorado e com grandes cardumes à espera dos primeiros barcos. A Nova Ericeira prometia suprir o mercado interno de pescado no Brasil, que naquela época estava nas mãos dos armadores portugueses. Além abastecer o mercado interno, o empreendimento pesqueiro também iria gerar milhares de empregos e movimentar a economia de Santa Catarina.

         Entre 1818 e 1822, ano da Independência do Brasil, o governo português investiu uma pequena fortuna na colônia. O dinheiro deveria ser usado para compra de terras, casas e no auxilio financeiro dos colonos até que os barcos ficassem prontos. Foi disponibilizado um valor que daria para comprar cerca de 20 barcos de pesca.

O tempo passou e para revolta dos colonos nenhuma embarcação foi entregue. Ofereceram por empréstimo um barco velho “caindo aos pedaços”, que foi recusado. Os pescadores teriam que bancar a manutenção do barco e entregar parte do pescado capturado ao governo catarinense. Os colonos também ficaram insatisfeitos com a distribuição das terras, que além do atraso para receber o certificado de posse, estavam localizadas bem longe do mar.  

O governo que injetou milhões na colônia foi incapaz de administrá-la. Sem controle, caiu nas mãos de um grupo político, que montou um esquema de corrupção. Os barcos até apareceram, mas não foram usados no empreendimento pesqueiro e sim para os negócios de uma família tradicional catarinense. As terras também tiveram o mesmo destino.

A Colônia Nova Ericeira foi extinta em 1824 e substituída pela vila de Porto Belo. Dos cerca de 400 colonos que vieram da Ericeira, apenas 25 conseguiram retornar a Portugal. Os que ficaram foram expulsos de suas terras e muitos morreram na pobreza extrema. Outros conseguiram ainda arrumar emprego em barcos de pesca na cidade do Rio Janeiro.

Com o fim da colônia, o grupo político que lapidou os recursos destinados à compra de terras e barcos de pesca, fez de tudo para destruir provas e colocar a culpa nos pescadores. Os colonos da Nova Ericeira ficaram conhecidos na história como vagabundos, preguiçosos, que vieram de Portugal para ganhar dinheiro sem trabalhar. E, na verdade, foram as principais vítimas. Acabaram esquecidos pela história oficial, bem como o dinheiro desviado pelo grupo político.

Os bastidores desse esquema de corrupção estão no livro-reportagem “1818 — A história da colônia criada por Dom João VI que foi alvo de disputa entre brasileiros e portugueses no século XIX”. A obra está disponível nas livrarias Catarinense e no site da Amazon: https://www.amazon.com.br/dp/B082XG39K4 

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