sexta-feira, 24 de junho de 2011

O Quilombo Esquecido

Quando os primeiros escravos chegaram ao sertão do Valongo, em Porto Belo, no século 19, não descobriram apenas um lugar isolado, rodeado por morros e pela floresta de mata atlântica. Eles encontraram também um lugar para começar uma nova vida, esquecer os maus tratos e a exploração de uma sociedade escravagista. Surgia assim o quilombo do Valongo, um dos 11 reconhecidos pela Fundação Cultural Palmares em Santa Catarina.


Comunidade é cercada por morros
Para chegar ao quilombo é preciso andar por uma estrada de terra batida. É nela que estão as casas do Valongo. Energia elétrica existe, mas faltam sinal telefônico, comércio e até serviços básicos, como um posto médico. A unidade de saúde e o mercado mais próximos ficam a 12 quilômetros, em Tijucas. Foi numa das casas localizadas a margem da estrada de terra batida que encontramos o senhor Jonas Luiz da Costa, 74 anos, e a esposa Maria Izabel, 76 anos. Simpático e hospitaleiro, seu Jonas atendeu a reportagem do Jagoz Catarina e contou que muita coisa mudou no Valongo nos últimos 60 anos.

- Tem muita diferença. Antes a vida era trabalhar na agricultura e a agricultura hoje não está dando mais nada. Na época que nos criamos plantávamos de tudo, era banana, arroz, milho e mandioca. Nós fazíamos muito açúcar grosso aqui, mas não é o açúcar mascavo de hoje – recorda.


Seu Jonas nasceu e sempre morou no Valongo
Apesar de se lembrar do passado, o que seu Jonas sabe dos antepassados é muito pouco.

- Não conheço esse quilombola, carambola e essas coisas eu não entendo. Quando me perguntam se meus pais e meus avós foram do tempo da escravatura eu respondo que não sei. Uma avó, o pai dizia que era, mas os outros avôs meus não foram – concluiu o morador do Valongo.

Reconhecimento aconteceu em 2004

Palmares é o mais conhecido quilombo brasileiro, datado no século XVII, em Alagoas
Quilombolas são descendentes de africanos escravizados que mantêm tradições culturais, de subsistência e religiosas ao longo dos séculos. O Valongo foi reconhecido como comunidade remanescente em dezembro de 2004, pela Fundação Cultural Palmares, órgão vinculado ao Ministério da Cultura.

Segundo a coordenadora de Articulação e Apoio às Comunidades Quilombolas, Miriam Caetana de Souza Ferreira, não é só a Fundação Palmares responsável pela preservação da memória do quilombo.

- Nosso objetivo é promover a preservação dos valores culturais, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira, e atuar, em todo o Território Nacional, diretamente ou mediante convênios com os Estados, Municípios e entidades públicas ou privadas – explicou a diretora.

Na comunidade, os moradores seguem a Igreja Adventista do 7ª Dia. O pastor André Luiz de Oliveira, que atua há dois meses no Valongo, reconhece que a comunidade não gosta de falar sobre a origem de seus antepassados.

- A igreja Adventista é aberta a discussão da cultura e origem da comunidade, mas os moradores não gostam de falar no assunto. A igreja não faz nenhuma restrição e o que percebi até agora é que as pessoas aqui são muito tímidas. Além do trabalho religioso, a igreja realiza diversos trabalhos sociais no Valongo – enfatizou o pastor.

Município está presente
Escola atende seis alunos
Além Igreja Adventista, a Prefeitura de Porto Belo mantém uma escola primaria e realiza a manutenção do Sertão do Valongo.

- Na comunidade temos uma escola e fazemos o transporte escolar para os alunos dos ensinos fundamental e médio. Oferecemos também a merenda escolar – disse o secretário de Educação de Porto Belo, Fernando Scheffler.

Para este ano, uma novidade com relação ao Valongo vai ser a inauguração da Casa de Memória.

- Será um local para preservar a memória da comunidade. A casa contará com fotos e objetos antigos do Valongo – disse a presidente da Fundação Cultural de Porto Belo, Cristiane de Jesus.

Nenhum comentário:

Postar um comentário